Sundance recebe estreia mundial de 'Sergio', com Wagner Moura no papel-título Ator interpreta o diplomata brasileiro morto em ataque terrorista no Iraque, em 2003.

Roteiro é baseado na biografia 'O homem que queria salvar o mundo'


Wagner Moura em cena do longa, no qual Ana de Armas interpreta a economista argentina Carolina Larriera, reconhecida como mulher de Sérgio Vieira de Mello em 2017 pela Justiça brasileira (foto: Netflix/Divulgação)


Wagner Moura acaba de acrescentar ao seu currículo mais um trabalho no cinema: ele já foi capitão, piloto da Força Aérea cubana, salva-vidas em uma praia, hacker de ficção científica, entre outros. Agora, interpreta o diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello (1948-2003), alto comissário das Nações Unidas para os direitos humanos, no filme Sergio, produção que chega aos cinemas e à Netflix em abril.

O longa teve sua estreia mundial na última terça (28), fora de competição, no Festival de Cinema de Sundance (EUA). Moura também participa do festival como membro do júri na categoria ficção internacional. Baseado na biografia O homem que queria salvar o mundo, escrita pela diplomata americana Samantha Power, e dirigido por Greg Barker, que já havia produzido um documentário biográfico homônimo para a HBO, o filme é uma ficção que se concentra nos últimos anos da vida de Sérgio, como o brasileiro era conhecido no círculo diplomático.




Interpretado por Wagner Moura, o diplomata acaba se envolvendo afetivamente com a economista argentina Carolina Larriera (Ana de Armas), que só em 2017 foi reconhecida pela Justiça brasileira como esposa de Sérgio. Carolina foi a última pessoa próxima a ver o diplomata com vida. Ele foi morto num atentando terrorista à sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Bagdá, no Iraque, em 19 de agosto de 2003, quando exercia sua função de tentar restabelecer a democracia no país, após a invasão do Exército americano, que levou à queda de Saddam Hussein.

"(Sergio) Não é uma negação a Narcos. Acho que a série teve uma grande importância política. O grupo latino é o mais sub-representado em Hollywood, não apenas no percentual de atores na tela, mas na maneira como suas histórias são contadas"
Wagner Moura, ator

O filme explora também o tempo que Sérgio passou como representante especial da Administração Transitória da ONU no Timor-Leste, entre 1999 e 2002, função em que foi bem-sucedido, ao ajudar a forjar  uma nova Constituição e encaminhar o país para a democracia. Antes disso, ele já havia atuado com bons resultados em várias missões em Bangladesh, Chipre, Moçambique, Líbano e Camboja.

Cotado para ser o sucessor de Kofi Annan como secretário-geral da ONU, Sérgio aceitou com relutância a tarefa no Iraque e encontrou muita resistência americana para o seu trabalho. O atentado a bomba que o matou foi mais tarde reivindicado pela Al-Qaeda, que confirmou que o brasileiro era o alvo principal. A linha condutora do filme, que funciona com diversos flashbacks, é o tempo que Sérgio pode ter passado preso nos destroços da explosão.

Esteriótipos

Sergio faz parte do projeto de Wagner Moura de produzir filmes sobre figuras latinas sem reproduzir estereótipos. "Não é uma negação a Narcos. Acho que a série teve uma grande importância política", disse Moura em Sundance, referindo-se à série dirigida por José Padilha e distribuída pela Netflix, na qual ele interpreta o chefão da droga colombiano Pablo Escobar. "O grupo latino é o mais sub-representado em Hollywood, não apenas no percentual de atores na tela, mas na maneira como suas histórias são contadas", afirma o ator. Depois de ler o livro de Power e assistir ao documentário de Baker (que já tinha o direito sobre a história), entrou em contato com o diretor e descobriu que ele também queria fazer um novo filme. "A ambição era falar sobre empatia." Para o ator e produtor, Sérgio foi um dos últimos grandes líderes mundiais a ter essa característica.

"Esse projeto faz sentido na minha trajetória. Vivemos em um mundo em que defender os direitos humanos virou algo errado."
Wagner Moura, ator

Moura fez contato com os filhos de Sérgio, que vivem em Genebra, e com Carolina, que hoje mora no Rio e é professora universitária, mas conta que houve relutância em relação à nova produção. "Existe uma disputa de narrativas com relação à vida de Sérgio", diz. "Mas nosso projeto está baseado sobretudo no livro da Samantha e em outras pesquisas." Na opinião do ator, a história continua tendo força porque Sérgio era um ser político, brasileiro, que acabou assassinado por conta da sua atuação em defesa dos direitos humanos. "Esse projeto faz sentido na minha trajetória", diz Moura. "Vivemos em um mundo em que defender os direitos humanos virou algo ‘errado’." Em sua estreia como diretor, com Marighella, pronto desde o início do ano passado, Moura enfrentou problemas para distribuir o filme no Brasil. Finalmente, o lançamento foi marcado para 14 de maio próximo.

Já sobre Sergio, o ator espera que o longa seja recebido "com muito amor" e diz que não vê nenhum potencial de polêmica no filme. "Não é possível que exista alguém que, mesmo com um olhar político diferente do meu, não dê importância à trajetória de Sérgio Vieira de Mello", afirma. "Ele era um cara muito pragmático." 

Moura cita uma cena do filme em que o diplomata encontra um dos líderes do Khmer Vermelho, partido de extrema-esquerda do Camboja, Ieng Sary. Os dois foram colegas na Sorbonne e participaram das revoltas estudantis de maio de 1968, em Paris. Na ocasião, Sary lembrou, decepcionado: "Você também era um revolucionário". (A ação de Sérgio no Camboja levou à repatriação de 350 mil refugiados.) O diplomata teve ainda bom trânsito com George W. Bush. "Sérgio sabia jogar o jogo de poder, o que não desmerece em nenhum momento sua atuação. Ele admite que não pode mudar o mundo, mas que pode ajudar esses refugiados. Isso já é muita coisa", diz Wagner Moura.

Fonte: Estado de Minas

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