Wagner Moura deixa heroísmo de lado para viver falsário em "Vips"


Para dar vida, na tela, ao estelionatário Marcelo Nascimento da Rocha, Wagner Moura reencontrou-se com sua própria trajetória.

Voltou a fazer anotações sobre o personagem nos caderninhos que, no começo da carreira, eram seu talismã e retomou a abordagem à Stanislávski, com a interpretação de viés psicológico.

Parece ter sido convencido, de uma vez por todas, de que aquilo que é bem inventado é uma história, e não uma mentira.

"Ele é melhor ator do que eu", diz, sobre o personagem que sucederá o capitão Nascimento na tela.


Para Wagner Moura, capitão Nascimento é um personagem trágico e político, mas também é pop

"Vips", que estreia nos cinemas nesta sexta-feira, após ser premiado no Festival do Rio, conta a história do jovem que se fez passar pelo filho do dono da Gol. Mas conta a história, um pouco, da forma como Moura a viu.

"Ele não engana ninguém para ganhar dinheiro. Ele se torna realmente o cara que ele está fingindo que é", diz.

Moura leu o roteiro de "Vips", escrito por Bráulio Mantovani ("Cidade de Deus", "Tropa de Elite") em 2008, no momento em que encenava "Hamlet".

Já tinha ouvido falar no falsário da Gol, mas não se interessara pelo assunto. Bastou, porém, pegar o roteiro para que a história se tornasse outra em sua cabeça.

"Eu vi ali um menino inteligente, brilhante, brincando de ser outras pessoas. Ele estava se buscando, como todos nós. Ele se olhava no espelho e não reconhecia", diz, reflexivo, calmo como o capitão Nascimento não conseguiria ser. "Tanto que, quando é desmascarado, é como se fosse a morte dele."

É, de alguma maneira, o que vive o ator ao fim de um papel intenso? "Ah, é uma mortezinha também", sorri, consentindo. "Alguns papéis são uma despedida de um pedaço de você próprio."

"COOL"

Depois de muito falar sobre segurança pública, violência e até de se ver colocado em debates ideológicos por conta de "Tropa de Elite", Moura parece se deleitar com o discurso que o novo personagem lhe empresta.

O ator recebeu a Folha para uma entrevista na tarde de sábado na Casa de Hóspedes, um sobrado, em Botafogo, que Marco Nanini arrumou para receber atores estrangeiros ou colegas de outras cidades. Moura está ali com a família porque foi expulso de casa pelos cupins. Teve de fazer uma dedetização.

E quem vê Moura passando um café no coador de papel e pegando no colo o filho caçula, de oito meses, não tem sombra de dúvida: sua personalidade não é das que se deixam desnortear pelo sucesso, sua vida não foi contaminada pela "celebritite", a doença da celebridade.

"Não vou ser palhaço desse circo", diz, referindo-se à decisão que tomou assim que a fama avizinhou-se. A decisão era simples. Entrevistas só para falar do trabalho ou colocar-se politicamente.

"Essa dimensão da celebridade contamina o próprio trabalho do ator. Você aparece tanto que deixa de ser crível", defende.

Moura lembra-se de quão inconformada ficou uma assessora da Globo quando ele se recusou a aparecer numa revista de celebridades, à época de "Carga Pesada".

Mas ele sabe que, ao construir essa distância, construiu também uma reputação. "Às vezes, sou visto como uma pessoa antipática, refratária. Não é isso. Só não quero isso pra mim."

A fama, que começou na TV, atingiu o auge com o capitão Nascimento, tornado herói nacional.

"O que adoro nesse personagem é que ele é político, mas também é pop. É um personagem bonito. É trágico", diz, com a voz grave e em tom baixo por recomendação médica. "Estou com faringite. E o médico disse: 'É só parar de falar que passa'." Mas Moura não vai parar.

Fonte: Folha de São Paulo

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