Roteirista fala das diferenças entre 'Tropa de Elite' 1 e 2

Bráulio Mantovani diz que o novo filme de José Padilha é melhor porque teve o Capitão


"Com o Tropa, eu e o Wagner (Moura) criamos uma ligação muita boa. A gente gosta de trabalhar junto. Ele gosta do que eu escrevo e eu gosto muito do que ele faz com o que eu escrevo. Ele me surpreende, vai além do meu texto"

Roteirista de Tropa de Elite 1 e 2, Bráulio Mantovani é categórico ao afirmar que o segundo, com estreia prevista para o próximo dia 8, é “muito melhor que o primeiro”. E uma das razões para isso é o roteiro da continuação da saga dos ‘homens de preto’ ter sido pensada desde o início para ter o Capitão Nascimento como personagem central. O primeiro filme foi rodado tendo o personagem de Wagner Moura como um mero coadjuvante, que só aparecia na tela aos 50 minutos do longa. “Ele era um personagem menor. Só que, graças à performance do Wagner, o Capitão Nascimento cresceu muito”, diz Mantovani, que teve esse erro apontado por algumas pessoas que viram a versão original de Tropa 1. Mantovani explica que Tropa 2 é dramático, enquanto seu precursor era descritivo. Com um currículo repleto de filmes marcados por terem um pé na realidade – entre eles Última Parada 174 e Cidade de Deus –, o roteirista falou ao site de VEJA.


Quem já viu diz que Tropa de Elite 2 é melhor do que o primeiro. Por quê?
Eu considero o Tropa 2 muito melhor do que o Tropa 1 porque a gente aprendeu com os erros do primeiro. Tivemos muitos erros. Na verdade, o roteiro foi consertado na montagem. Originalmente, o Tropa 1 foi escrito tendo como protagonista e narrador o personagem do Mathias, interpretado pelo André Ramiro. O capitão Nascimento aparecia já com 50 minutos de filme. Havia um problema com o personagem do Mathias. A gente sabia disso. É um personagem muito passivo, mas a gente achava que funcionaria porque ele era um narrador. A ideia era que ele ficasse um pouco distanciado da história para poder descrever aquele mundo da polícia assim como o Buscapé descreve o munda da favela em Cidade de Deus. Essa era a ideia do José Padilha (diretor de Tropa), antes mesmo de eu entrar no roteiro. Ele queria algo parecido. E não funcionou.

Como foi a constatação de que era preciso mudar?
Todos diziam a mesma coisa: 'O filme começa aos 50 minutos'. Minha mulher (na época, namorada), Carolina Kotscho, que também é roteirista (escreveu 2 Filhos de Francisco), fez uma crítica muito dura ao filme, dizendo que a história interessante era a do Capitão Nascimento. E, no roteiro, ele era um personagem menor. Só que, graças à performance do Wagner (Moura), o Capitão Nascimento cresceu muito. A gente já escreveu o segundo filme com esse Capitão Nascimento. O foco é a história dele. O filme também transcende o universo da polícia para ir para a segurança pública. Então, ele ficou mais complexo, ganhou uma nova camada, a política. E, enquanto o primeiro filme é predominantemente descritivo, o segundo é mais dramático. Os conflitos pessoais do Capitão Nascimento, que no Tropa 1 eram periféricos, agora são a espinha dorsal junto com o conflito profissional dele. Isso faz a experiência de assistir ao Tropa 2 melhor do que assistir ao Tropa 1.

Foi complicado você e o Wagner Moura fazerem VIPs e Tropa de Elite ao mesmo tempo?
A gente não se preocupou porque as histórias são muito diferentes. São filmes de características narrativas muito diferentes. No VIPs não tem narração em off, por exemplo. O VIPs é um filme muito mais de personagem, que mergulha na psicologia do personagem. Ele tem dimensões sociais também, mas não tem nada a ver com violência. Ambas as histórias vieram da realidade, mas são de origens tão distintas que elas geraram formas narrativas diferentes. A coincidência está em que parte da equipe é uma dupla que eu chamo de M&M - Moura e Mantovani. Com o Tropa, eu e o Wagner criamos uma ligação muita boa. A gente gosta de trabalhar junto. Ele gosta do que eu escrevo e eu gosto muito do que ele faz com o que eu escrevo. Ele me surpreende, vai além do meu texto. E isso é uma coisa, realmente, incomum. Mas são pegadas tão diferentes, que é impossível comparar os dois filmes.

Você assina roteiros de vários filmes que têm um pé na realidade. Você acha que o sucesso dos reality shows forçam os filmes a se venderem como história real?
Olha, eu não assisto a esses programas. Já vi um pouco. Mas aquilo é real? Quando você tem uma câmera, as pessoas já começam a representar. Aí, já não tem mais a realidade. Você tem uma versão da realidade. Aquelas pessoas constroem um personagem. Elas querem ser vistas de determinada maneira. É o modo de contar uma história que a torna verdadeira, e isso vale até para filmes como Alice no País das Maravilhas, onde há um coelho falante. Se o público pensa como eu, não sei. Mas não me preocupo com isso. Eu gosto é de contar histórias que me perturbam.

Você já foi obrigado a dizer um "não" a algum convite e depois se arrependeu?
Mais de um. Não é que eu me arrependi, é que, no momento, era impossível. Só lamento não ter sido possível. Um desses casos foi Assalto ao Banco Central. O (diretor) Marcos Paulo me ligou e, quando ele começou a falar sobre o filme, eu disse: "Pode parar de falar, porque eu estou envolvido num projeto de série de TV com esse tema". E, aí, não seria nem ético. Mas o projeto de TV acabou não acontecendo. Então, eu poderia ter escrito o longa... Lamentei porque é uma história que eu gostaria de ter contado. Mas a vida é assim. Como diria o meu ídolo Dr. House, da série de TV, citando o Mick Jagger: "You can't always get what you want" (você não pode ter sempre tudo o que deseja).


Fonte: Veja

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