Hamlet para muitos


A paixão pela saga do príncipe atormentado e com desejo de vingar a morte do pai mobiliza o ator Wagner Moura, o papel principal da peça Hamlet, que chega ao Recife no próximo sábado e domingo (dias 27 de junho, às 20h, e 28 de junho, às 19h), no Teatro da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). O intérprete ficou famoso nacionalmente depois de personagens na televisão (como o vilão Olavo, da novela da Globo Paraíso tropical) e no cinema (o Capitão Nascimento, de Tropa de elite). Um ano depois da estreia deste que é seu quarto espetáculo teatral, este baiano nascido em Rodelas, cidade no Vale do São Francisco, e criado em Salvador - tendo se mudado para o Rio de Janeiro desde 2000, continua empolgadíssimo com o desafio de liderar a montagem com ares de superprodução. São 10 atores no palco e um cenário de grande porte, sob a direção de Aderbal Freire Filho.

Casado com a fotógrafa Sandra Delgado e pai de Bem, de 3 anos, Wagner Moura permanece na estrada até o final de julho. Em agosto, interrompe a turnê de Hamlet para participar das filmagens de Vips, longa-metragem dirigido por Tonico Mello, da O2 Filmes. A apresentação do sábado terá um sabor especial. Nesta data, o ator completa 33 anos.

"O que mais me deixa alegre é ser um espetáculo de longo alcance. Dizer que a linguagem de Shakespeare é intransponível é ideia de intelectual bobo. Hamlet é uma história que acaba se resolvendo com o que ele escreveu há 400 anos. Não pede economia, e sim, arrebatamento", argumenta. Na última quarta-feira, depois de mais um ensaio, Wagner Moura conversou por telefone com o Diario. (Tatiana Meira)

Trabalhar com o Aderbal Filho foi a realização de um sonho?

Em Dilúvio em tempos de seca, em 2004, em que contracenei com a Giulia Gam, a direção era do Aderbal. Tinha muita vontade de voltar a fazer teatro, pois fiquei encantado com a fome dele de dirigir. Então, pensei que Shakespeare era perfeito para ele trabalhar, pois as peças são muito teatrais, o imaginário dos séculos 16 e 17 tem um impacto muito forte no espectador. Sou um entusiasta deste tipo de teatro. Nossa parceria é muito bonita e só quero fazer teatro com ele.

Sua interpretação foi escrita pela crítica como febril, agitada, selvagem. Como foi construindo o personagem para dar a ele este tom mais verdadeiro?

Selvagem, adoro esta palavra. (Risos). Gosto muito de um teatro físico, expressionista, no qual o ator não precisa puxar o freio de mão. É muito intenso, uma leitura que vem de minha herança brasileira, latino-americana, baiana. Faço um Hamlet emocional, vigoroso, o contrário da interpretação europeia, contida. Prefiro um teatro antropológico, sem tanto psicologismo. Juntei a minha natureza de ator expressionista com um autor que pede isso, o arrebatamento.

Ao lado do diretor, e com o auxílio da professora de inglês Barbara Harrington, você realizou a tradução do texto para o português. Como foi esta experiência?

Queríamos ir direto ao ponto, mas não para simplificar ou deixar a linguagem coloquial. Somos muito fiéis ao texto, à linguagem poética mostrada. Mas não optamos por um português arcaico. O verbo "to go", por exemplo, traduzimos como "vá", ao invés de "ide". Não fizemos uma versão literária, para ser publicada, mas a estrutura em versos foi mantida. Com a poética, mas sem os rococós.

Antes da estreia, o canal de TV por assinatura Multishow exibiu um documentário com os bastidores da peça, os ensaios. Existe a possibilidade de este material se transformar em filme?

Este é um trabalho da Sandra Delgado, minha mulher, que documentou o processo desde o início. O teatro é algo efêmero. E, às vezes, é triste, porque o espetáculo acaba e fica sem registro. Adoraria ter visto a preparação de O rei da vela, por exemplo (texto de Oswald de Andrade, na montagem histórica do Teatro Oficina). Ela ampliou o foco do projeto para o Amir Haddad, o Zé Celso, o Antunes Filho. Está registrando outras peças e é provável que vire filme.

Esta é a primeira turnê de Hamlet, que antes lotou os teatros onde esteve em cartaz em São Paulo e no Rio de Janeiro. Por quê terminar este giro pelo Brasil em Salvador?

É muito significativo fechar a turnê em Salvador, onde comecei a fazer teatro profissionalmente há 18 anos, numa escola de artes, a Casa Via Magia, na Federação. Fiz A máquina, um espetáculo importante em minha vida, logo que saí de lá, mas nunca consegui voltar à Bahia com uma peça. E Hamlet é meu quarto trabalho no teatro. Mas o Recife também quero muito fazer, porque estreei A máquina aí e é onde moram a maioria dos meus tios e primos.

Embora seja muito extenuante manter Hamlet em cartaz, como se sente em relação ao êxito da peça?

Sou um ator de teatro e me sinto realizado, em casa, quando estou atuando. De fato, é um momento importante não só da minha carreira, mas da minha vida. Conseguimos fazer uma montagem de Shakespeare comunicativa, quebrando os preconceitos contra o autor. Vou sentir saudade quando acabar a turnê, pois venho amadurecendo esta fome de estar em cena.

Fonte: Diário de Pernambuco


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