Tropa de elite oficial tem cinco minutos a mais do que a versão pirata



Você e as torcidas de Flamengo, Bahia e Vitória devem saber que Tropa de elite, o longa-metragem de José Padilha (Ônibus 174), foi pirateado muito antes da sua estréia oficial (o que ampliou a discussão no Brasil sobre esse tipo de crime) e que ele mostra a ação do Bope (Batalhão de Operações Especiais), a nata da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Cerca de um milhão de cópias do DVD pirata já foram vendidas, sendo visto provavelmente por cinco milhões de pessoas. Ainda assim, dada a relevância e polêmica do filme que custou R$10,5 milhões, Tropa de elite atraiu 178 mil espectadores aos cinemas do Rio e São Paulo no último fim de semana (uma abertura 48% maior do que a de A grande família, o filme brasileiro mais visto em 2007). Hoje, ele estréia em outras cidades e alcança 300 salas no país.

“Agradeço aos espectadores por estarem indo conferir nos cinemas a versão final do filme”, declarou José Padilha, 40, em nota oficial. Em tempo: a versão que estréia em Salvador é ainda melhor do que a do DVD pirata. Embora não altere a sua essência e final, o filme ganhou mais cinco minutos, nova narração, divisão e diversas cenas foram reeditadas.

Acusado (equivocadamente) de fascista por alguns intelectuais e até por colegas de José Padilha, Tropa de elite é baseado livremente no livro homônimo do sociólogo Luiz Eduardo Soares (ex-secretário nacional de Segurança) e de dois ex-policiais do Bope, André Batista e Rodrigo Pimentel. Mas, acima de quaisquer discussões, é um excelente filme de ação.

Segunda-feira, conversamos por celular com o ator baiano Wagner Moura, 30, que se encontrava em São Paulo, divulgando a produção na qual interpreta o protagonista, o capitão Nascimento. Estressado e com o primeiro filho prestes a nascer, Nascimento tenta encontrar um substituto para o seu posto no duro e honesto Bope, enquanto, paralelamente, dois PMs se indignam com a corrupção da corporação em que atuam.

A seguir, leia trechos da entrevista com Wagner Moura que, hoje, já deve estar curtindo suas bem merecidas férias na Europa, junto com a mulher e o filho Bem, de 1 ano e dois meses. Na volta, ele vai se preparar para fazer Hamlet no teatro, em peça dirigida por Aderbal Freire Filho.

“Gostaria muito que a peça estreasse aí, em Salvador, em maio”
, diz.

Como você chegou ao projeto do filme Tropa de elite?
Eu tinha amigos que estavam no projeto há mais de um ano, como o Lula Carvalho (diretor de fotografia), e eles me falavam muito sobre o filme. Então, me escalei e José Padilha me mandou o roteiro. Eu conhecia ele de Ônibus 174, gostava do seu olhar humanista sobre uma história tão violenta.
O capitão Nascimento é um personagem complexo. Não é exatamente um herói, mas, ao narrar uma história que envolve atitudes violentas na sua vida policial - numa sociedade assustada pelo crime - e paternidade na família, muita gente pode aplaudi-lo como se ele fosse um herói. O que você acha?
Sim, o ponto de vista dele é muito importante na história, o que não quer dizer que eu compartilhe das suas atitudes. Quando li o roteiro, pensei logo em interpretá-lo, pois sou velho para fazer o Neto (personagem de Caio Junqueira). Nascimento é um homem dividido e o que sente mais conflito no filme. Fico preocupado quando vejo a platéia tratá-lo como herói, pois, embora seja um policial honesto, ele também tortura.
Creio que este é um dos pontos que levam alguns a taxar Tropa de elite de fascista. Você até escreveu um artigo no jornal O Globo defendendo o filme. Acho que também não estamos acostumados a ver policiais como protagonistas no cinema brasileiro...
É um fato novo realmente, mas me incomoda que o filme seja chamado de fascista. Também não acho que a tolerância zero seja a solução para a questão da violência, mas, num momento de crise intensa como o atual, o filme aborda uma coisa fundamental: o problema da segurança pública no país. Eu acho, por exemplo, que a repressão policial não vai diminuir o consumo das drogas. Sou a favor da legalização, pois isso acabaria com o tráfico nos morros e nos locais onde o Estado não entra há muito tempo para cumprir o seu papel.
Você acredita que a pirataria vai prejudicar muito o desempenho comercial do filme?
Muito eu não sei, mas acho que vai sim. Cinco milhões de pessoas, são os cálculos, já viram a versão pirata. O DVD oficial do filme também será prejudicado, creio. Terá que ter muito material extra para despertar interesse. Tem gente que acha que a pirataria democratiza a produção audiovisual, mas isso é uma visão simplista, distorcida do problema.
Você está no olho do furacão da mídia: Olavo, o vilão de Paraíso tropical, saiu de cena e entrou o capitão Nascimento. Você lida bem com essa superexposição?
Uma novela de audiência alta, em que o meu personagem era o vilão e assassino, e um filme tão falado me deixaram muito exposto, é verdade, mas logo outra novela explode e a superexposição passa. É normal essas coisas, o ator não pode é viajar demais.
Aliás, você não quis assinar contrato estável com a Globo, preferindo ficar livre agora para se dedicar a outros projetos. Quais os planos?
Tirar férias com a família e, na volta, me preparar para fazer Hamlet sob direção de Aderbal Freire Filho. Sempre quis fazer esse personagem. Os ensaios começam em janeiro. Gostaria muito que a peça estreasse aí, em Salvador, em maio.
Você faz parte de uma geração de atores baianos que foram juntos para o Rio e conquistaram sucesso no cinema e na Globo em pouco tempo. Vocês se vêem muito?
Claro, somos um bando de baianos espalhados pelo mundo (risos). Eu, o Vladimir (Brichta) e Lázaro (Ramos) somos muito amigos, nos encontramos, convivemos. Agora mesmo, Lázaro ligou para dizer que ia lá em casa ver o Bem, meu filho.
Opinião

Um tiro na cara da hipocrisia nacional

O longa-metragem de José Padilha é muito corajoso. O filme e seu diretor não comungam com o desvio de caráter, a dubiedade moral e o pseudo-esquerdismo que acometem o Brasil mais do que nunca. Um país no qual muita gente, por ignorância, pobreza de espírito ou interesses escusos, perdeu a noção do certo e do errado. Um lugar onde campeia a hipocrisia.

Com um realismo pouco visto recentemente no cinema mundial, Tropa de elite conta a sua história do ponto de vista de um policial durão, honesto e que tortura para obter confissão. Um tipo que já foi mostrado centenas de vezes em Hollywood. Aqui, porém, ele irrita aqueles que acham que esse artifício narrativo de identificação (entre o espectador e o personagem) representa, necessariamente, o pensamento social do diretor.

O filme, pode-se dizer, forma uma espécie de trilogia com o já histórico Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles, e com o subestimado Cidade dos homens (2007), de Paulo Morelli. O primeiro mostrava a violência social do Rio a partir do ponto de vista dos traficantes; o segundo, pela ótica da comunidade; e Tropa de elite, pelo olhar de um policial.

Seguindo os princípios clássicos de um filme hollywoodiano de ação policial, Tropa de elite não perdoa ninguém. Manda tiros na corrupção da polícia carioca, nos políticos, na crueldade dos traficantes e na hipocrisia da classe média que consome cocaína e promove passeatas contra a violência. O Brasil atual é um DVD pirata, mas Tropa de elite é 10. (HB)

Fonte: Folha

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