"Paraíso Tropical" registra o maior ibope de qualidade da década




"Paraíso Tropical" é a melhor novela com a grife Gilberto Braga dos últimos dez anos. Esboça-se um movimento para depreciar a trama, também assinada por Ricardo Linhares, usando como pretexto o baixo ibope do capítulo de estréia. Como se o único indicador de qualidade de um produto fosse sua audiência. A indústria da música é uma prova: o pagamento de jabá explica boa parte dos hits por aí.

Em 1994, "Pátria Minha" encerrava a trilogia gilbertobraguiana de histórias sobre corrupção ("Vale Tudo" e "O Dono do Mundo"), informa o "mão-na-roda" site Teledramaturgia.com.br. Foi uma obra menor do que "Vale Tudo". Depois, ele fez a minissérie 'Labirinto' (1998) e a de época "Força de um Desejo" (1999). Sem muitas repercussões. "Celebridade" (2003) o recolocou no topo das preferências e lembranças.

Agora, "Paraíso Tropical" indica a disposição de Gilberto Braga de retomar a veia de cronista da urbanidade chique, testemunha dos discursos canalhas da elite, o tradutor dos códigos descolados, o mais liberal dos teledramaturgos do clã Globo. Ok, não está sozinho: está ali, na segunda menção, Ricardo Linhares. Sorry.

O verniz cinematográfico da nova novela das 21h apaga a chatice moralista de "Páginas da Vida" e seu Leblon realista, cujo único mérito foi provar que uma ex-integrante do "Big Brother Brasil" (Grazi) pode interpretar sua própria personagem, esbanjar simpatia e carisma, além de reforçar o valor de que "mulher admirada é a recatada, romântica e boazinha", em meio a tantas odaliscas midiáticas. Ana Paula Arósio errou a personagem e desmaiou.

Em "Paraíso Tropical", já está definido: Camila Pitanga será a grande estrela. "É uma cachorra daquelas", já disse Gilberto. Desde Gabriela, não aparecia assim na tela uma explosão de sensualidade mestiça, rebolado brasileiro, a nova Sonia Braga (a original sofreu um fiasco em "Páginas", ofuscada por Narjara Turetta, a vendedora de coco. Que papelão). Como bem definiu a repórter Fernanda Crancianinov (na primeira crítica da internet sobre "Paraíso Tropical"), Camila vive uma "profissional do sexo". Prostituta, não! Profissional do "séquisso", como diz um clássico vídeo do YouTube, sobre uma reportagem "trash" do SBT no Nordeste.

E Alessandra Negrini? A mulher do Otto ainda está contida. Passa uma imagem arrogante, um enjôo existencial, embora a direção de Denny Carvalho foque demais nos seios da atriz, em cenas de roupa molhada. No segundo capítulo, já rolou uma cena picante com o galã loiro Fábio Assunção, amado pela comunidade drag.

Vigor de Wagner Moura era o mesmo de Tony Ramos em "Bebê A Bordo" (1988-1989)
Vigor de Wagner Moura era o mesmo de Tony Ramos em "Bebê A Bordo" (1988-1989)
E Wagner Moura? Após ter ajudado o Todo-Poderoso em "Deus é Brasileiro", ele chega a seu ápice, após a bem-sucedida experiência em "JK". Em "Paraíso Tropical", o vigor de Wagner era o mesmo visto em Tony Ramos em 'Bebê A Bordo' (1988-1989). Só precisa evitar o risco do estrelismo, a picada da mosca-azul. O sucesso em uma novela das 21h produz monstros, mas principalmente atores neuróticos, com a realeza inteira na barriga. É preciso manter a humildade, ensina Grazi. A velocidade com que um objeto sobe pode ser a mesma de sua queda.

Mas o trunfo de "Paraíso Tropical" é sua história. O tema 'paraíso sexual' é oportuno. O Brasil virou o açougue do turismo mundial. Até militares americanos que lutaram no Iraque escolhem o Rio para relaxar as tensões com suas garotas. O país virou sinônimo de sexo. O que dizer de Gisele e outros modelos sensuais destas terras? Um sexo pago, maquiado, produtivo, afinal, movimenta uma indústria, influencia decisões, virou matéria-prima de tudo. A disputa entre os gêneros ajuda a explicar comportamentos, rixas, ódios, conflitos. Além de ser o gancho para as histórias mais interessantes da humanidade.

Em "Paraíso Tropical", está tudo lá: o desejo entre amantes de mundos diferentes, de sexos iguais, o maniqueísmo das gêmeas (a boa e a má), as falcatruas dos endinheirados (ótima referência ao 'Vale Tudo' brasileiro), os alpinistas sociais, o Rio como um balneário. Nada mais perfeito do que narrar essa história com a música "Difícil", do último CD de Marina: "Mas acontece que eu/Tenho esse vício/De gente difícil no amor/Alguém lá no início/Me aplicou/E me fez louca, me fez pouca/
Me fez o que sou: Difícil".

Fonte: Folha Online

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